terça-feira, 10 de abril de 2012

Programete 20 - Lima Barreto e o Jornalismo


No ano de 2010, a editora Companhia das Letras lançou o livro Recordações do Escrivão Isaias Caminha escrito por Lima Barreto. A obra foi publicada pela primeira vez em 1907 na forma de capítulos, na revista Floreal. Era o chamado folhetim. Somente em 1909, o texto foi lançado em livro. 

Recordações do Escrivão Isaias Caminha não é tão famoso quanto O Triste Fim de Policarpo Quaresma. Mas é importante por retratar o posicionamento do autor em relação à imprensa. Lima Barreto já trabalhava como jornalista desde 1902 e usou sua experiência para construir o enredo e os personagens. 

O escrivão Isaias é um senhor que rememora sua trajetória: jovem pobre que saiu do interior do Rio de Janeiro e seguiu para a capital federal em busca de novas oportunidades. Depois de passar fome, tornou-se contínuo em um grande jornal onde observava os bastidores da redação. Assim, ele traçou os perfis dos jornalistas, dos chefes de redação, do administrador e do proprietário. 

Na obra, o jornal não aparece como uma empresa respeitável que se dedica ao esclarecimento da sociedade com as informações do cotidiano e as reflexões sobre os problemas sociais. A trama aponta que o jornal O Globo é movido por interesses econômicos desonestos, com cotidianas falcatruas, negociatas e corrupção política. São mencionadas vendas de apoio ao governo, à políticos e à empresas. Quando o jornal não era procurado para as tramoias, havia extorsão. Ele ameaçava publicar, ou publicava difamações. Nesse quadro, o que menos interessava ao jornal era informar o leitor. E os jornalistas são apresentados com várias facetas críticas: como conservadores, arrivistas, mercenários, egocêntricos, narcisistas, incultos, prepotentes, elitistas e redatores medíocres. 

A grande polêmica que a obra suscitou é que era possível identificar vários personagens com a vida real. Alguns deles seriam pessoas conhecidas do público e do meio midiático como o já famoso autor Coelho Neto, jornalistas reconhecidos como João do Rio e Costa Rego, o conceituado gramático Candido Lago e o diretor Edmundo Bittencourt. O jornal O Globo seria uma paródia do Correio da Manhã, surgido em 1901 e dirigido por Bittencourt. 

A ironia é que o Correio era um veículo moderno para a época e fez oposição aos governos da Primeira República. Lima Barreto já havia trabalhado nele e não poupou criticas. Talvez tenha até cometido injustiças. Mas apesar disso, é uma obra questionadora do seu tempo. 

Texto: Célio J. Losnak

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